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O pop melancólico de Mela em "Não é amor"

  Como produzir nos dias de hoje um pop fantasioso ao mesmo tempo que não soe genérico e repetitivo, endossado por alguma fórmula mágica? Me...
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Como produzir nos dias de hoje um pop fantasioso ao mesmo tempo que não soe genérico e repetitivo, endossado por alguma fórmula mágica? Mela parece ter encontrado alguma fórmula, que ainda pretendo dissecar. Desde que a artista fez sua primeira aparição no palco do Festival da Canção 2024, percebia-se muita curiosidade sobre os seus próximos passos. Diretamente da Ilha da Madeira para o mundo, é interessante observar como Mela tem trilhado aos poucos sua carreira no mundo musical com uma identidade visual marcante, de uma artista jovem, promissora e com muito repertório cultural e artístico. 


Ser artista independente, por vezes, não é uma tarefa fácil. Por mais talentoso que um artista possa ser, gerir todas as etapas que envolvem a produção até o consumo de uma canção perpassa muitos desafios. Apesar de ser uma cantora e instrumentista, percebe-se visivelmente os passos de Mela nessa epifania que é ser artista na cultura digital. Ah, e também de uma artista que se desdobra entre ser uma sonhadora artisticamente e ser uma jovem como qualquer outra pessoa neste país, sendo estudante, por exemplo. Não basta produzir suas próprias canções, é preciso também conectar-se com a audiência. E Mela tem feito isso pouco a pouco.


Nesta sexta-feira (26/09), Mela lançou o seu segundo single de trabalho intitulado "Não é Amor". A canção sucede a sua estreia no Festival da Canção, sendo esse o seu primeiro trabalho após um período afastada. Segundo a artista, a canção é uma das apostas submetidas ao FDC 2024 junto com Água. E posso confessar: "Não é amor" foi lançada no timing correto e você descobrirá o motivo nesta análise.


"Um hino à independência"

"Não é Amor" é uma daquelas músicas de fim de verão, um momento de reflexão doloroso e sincero sobre um romance rápido.. ou não sei se podemos chamar de romance. Geralmente as canções de fim de verão falam sobre aquele romance perdido, que arde, impossível de se ter. Aqui temos um ponto interessante. A artista não canta sobre um amor que gostaria de ter. Mela canta sobre o amor que não queria ter e que, desde o começo, deixou claro que era temporário. Diferente do que podemos encontrar em canções de artistas como Taylor Swift, onde se canta sobre aquele amor perdido como em "Wildest Dreams", Mela faz o contrário aqui.


O amor de verão aqui foi um passatempo. "O agora não é para sempre". E de fato não é! Não é que a artista esteja aqui se lamentando ao entrar numa espiral de arrependimento, como poderíamos imaginar. Mas há uma tentativa de ser clara e objetiva a alguém (será?) sobre o que aconteceu no verão passado. É uma carta de reafirmação sobre um romance fantasioso que foi para o outro, que nunca aconteceu, mesmo que assim quisesse. Nota-se na letra da canção uma responsabilidade afetiva de quem canta para com o outro, sempre reafirmando suas intenções iniciais com o outro. Mela entoa também um nível de maturidade que nem sempre conseguimos alcançar nas relações:


Eu bem te avisei que eu amo depressa, não me peças a mão que tenho de ir, quando o amanhã chegar peço que me esqueças e deixas levar o que fomos aqui.

 

Mas, assim como nos filmes sobre romance e verão, esse não é um fim (é o que me parece). Assim como todo amor de verão, ainda fica aquele sentimento de nostalgia, de contemplação sobre o que poderia ter acontecido.. aquela melancolia que assola e que persegue. Ela não fecha a porta totalmente. Ainda há uma fresta que essa luz pode entrar. Não agora (isso ela deixa claro). Talvez, num futuro, seja possível desenvolver esse amor, essa paixão (?) É possível. Talvez estejamos a falar sobre pessoas certas, mas em momentos distintos? Ou é só uma jovem entoando um hino de amor a si mesma? 


"Não é Amor" é uma produção pop, com uma roupagem que beira o dream-pop, com referências de grandes artistas como Florence, por exemplo. A aproximação de Mela com Florence and the Machine não é novidade. No videoclipe de "Água", Mela já nos mostrava essa sintonia com a artista britânica.  Embora exista um preconceito sobre músicas pop, nas quais muitas vezes os artistas apostam no básico e no clichê, "Não é Amor" está longe disso. É claro, os elementos da música pop estão ali, mas Mela consegue amalgamá-los num pop efusivo. Sua sonoridade e suas letras se mesclam numa atmosfera nostálgica e criam um clímax de melancolia e fantasmagoria. O início da canção lembra alguma outra do álbum "Ultraviolence" da Lana Del Rey, talvez "Brooklyn Baby". Os solos de guitarra após a ponte na último refrão canção reforça essa estética, que cresce pouco a pouco e ganha vida entoando esse hino. Essa é uma fas faixas para ficar no loop durante o outono (ao menos aqui no hemisfério norte).


O que podemos esperar de Mela?
Para a jovem madeirense, como uma mala cheia de sonhos e letras poéticas, nos resta esperar uma projeção em território português (e por que não brasileiro?) tal como a artista merece. Mela é uma artista que se diferencia pela conexão real que estabelece entre a poética e a realidade. É, literalmente, uma artista sonhadora, e que está conseguindo criar essa identidade por meio de suas canções e dos videoclipes lançados até o momento.



Talvez, antes de um álbum (e por mais que eu esteja à espera dele), os singles parecem funcionar muito bem para ajudá-la a crescer e ampliar mais a sua base de fãs. Espero que Mela continue a trabalhar na construção desta identidade, incorporando referências que agregam ao seu trabalho, e que mostram um potencial incrível da artista em recriar, incorporar elementos e fantasiar o mundo.

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